José Osório Naves *
Gigante pela própria natureza com encantos mil, verdes matas e 8.500Km de praias atlânticas incríveis sob as luzes do sol tropical, o Brasil deveria ser líder no receptivo turístico internacional.
Mas não o é.
Infelizmente o país enfrenta um alarmante declínio em sua posição na avaliação global do turismo devido a uma série de desafios estruturais e políticos. Na avaliação de organismos internacionais como a OMT e TTCI, as previsões mais realistas o mostram despencando no ranking mundial, ocupando o 52° lugar entre 133 nações e o 5° na América do Sul, num rol de 13 vizinhos.
Medidas urgentes são necessárias, como investimentos robustos em infraestrutura, segurança e sustentabilidade, fatores cruciais para atrair turistas internacionais. Além disso é imperativo o interesse político renovado com parcerias público-privadas e coordenado para promover o turismo como uma prioridade nacional.
Os números apresentados pela Embratur e o Ministério do Turismo, muitas vezes não são confiáveis. Na verdade, os mais aceitáveis são do Banco Central, pelo controle dos gastos de estrangeiros no país.
Para o baixo desempenho brasileiro na captação de visitantes de outros continentes, um dos mais cruéis gargalos não são a distância continental, altos custos, violência ou a má qualidade dos serviços turísticos. O que mais afeta sua imagem é a carência de informações sobre o país, especialmente na Europa onde as poucas notícias o destacando são negativas e as nossas peças promocionais muitas vezes equivocadas sobre as informações que transmitem para públicos reservados entre 4 paredes de workshops.
Turismo não se faz por propaganda, mas pelo despertar do interesse das pessoas em conhecer lugares que lhes aticem curiosidades positivas.
Prova disso é que, quando uma celebridade mundial chega ao Brasil, pelo Rio de Janeiro, marca em sua agenda, em primeiro lugar, conhecer a miséria das favelas, só depois se interessa pelo Cristo Redentor e as belas e famosas praias do mais importante portão de entrada nacional. É fruto da informação que recebem.
Uma contabilidade díspar
A contabilidade turística brasileira começou em 1966 com a criação da Embratur. Nessa época havia 400 milhões de pessoas vagando pelo mundo e recebíamos 2.000 milhões de visitantes estrangeiros. 70 anos depois, atingiu o patamar de 6 milhões e 500 mil turistas de um contingente de 1 bilhão e 5oo milhões de viajantes circulando ao redor do planeta.
Índice de classificação
Na classificação do Índice de Competitividade e Viagens e Turismo (TTCI – sigla em inglês), em 2019, mesura os fatores preponderantes à consolidação dos negócios de turismo de cada país e o Brasil alcançou o 52° lugar mundial, sendo o 6° colocado nos países da América Latina e 4° na América do Sul. O relatório também aponta que as principais deficiências do setor turístico brasileiro estão a competitividade de seus preços (91° lugar), na infraestrutura de transporte terrestres (110° lugar) e na segurança púbica (128° lugar) entre 133 países avaliados. Muito pouco mudou de lá para cá.
Quem mais nos manda turistas
A partir de 2023, com a retomada da atividade global do turismo, o país voltou à normalidade e alcançou pouco mais da metade do índice de visitações anterior, antes da pandemia, recebendo 3.914.583 turistas, segundo dados do BC. A cidade mais procurada pelo turista internacional é São Paulo, para o turismo de negócios. Em seguida vem o Rio de Janeiro e depois Fortaleza pelas praias famosas, Foz do Iguaçu e Amazonia pelo turismo natureza.
Uma notícia positiva é que o Brasil, de acordo com a International Congress & Convention Association (ICCA), ocupa o primeiro lugar entre os países latino-americanos que mais recebem eventos intencionais. É o segundo do continente Americano e 7° do mundo, depois de Estados Unidos, Alemanha, Espanha, França, Reino Unido e Itália.
Países mais emissivos
Dos 3.914.000 turistas internacionais contabilizados no Brasil em 2023 a ordem dos países emissivos é:
· Argentina – 1.332.240. * França – 187.550
· Estados Unidos – 668.478. * Portugal – 182.463
· Chile – 458.576. * Alemanha – 158.582
· Paraguai – 424.460. * Itália – 129,823
· Uruguai – 334.703. * Japão – 47.123
Nessa contabilidade são: 2.449,979 Sul-Americanos
668.428 Norte Americanos
656.490 Europeus
Os males da desinformação
· O melhor exemplo da desinformação ocorreu com a isenção do visto diplomático aos maiores países emissivos, como Estados Unidos, Canadá e Japão. A benesse não aumentou um só visitante. Por quê? Porque não houve campanhas informativas sobre o fato nos países agraciados.
· Por falta dessa mesma carência de informações os argentinos, os que nos manda mais de 50% de todo o receptivo internacional, se concentram nas praias do sul, Rio Grande do Sul e Santa Cataria, porque nunca lhes foi informado que o país possui 8.500kms de lindas praias atlânticas, com a rodovia BR 101, asfaltada e com via dupla, que vai do RGS ao Rio Grande do Norte passando por paradisíacas paisagens tropicais.
· Os Estado Unidos, dos pouco mais de 600.000 que nos mandam, 50% vão para a Amazônia, para turismo ecológico, porque não lhes foi transmitida a informação que o país tem mais de mil lindas atrações urbanas ao sul.
Infelizmente a retomada de nosso receptivo alcançou pouco mais de 50% de turistas que antes nos visitavam até o lockdown, que já dista 2 anos. Será muito difícil alcançar a patamar anterior, pois não temos uma política inteligente promocional que muitas vezes é feita, quando o é, de forma ineficiente e errática na direção mercadológica, buscando países de continentes distantes e de pouco interesse em nos conhecer.
O melhor visitante é o vizinho, especialmente pela curta distância. No entanto o preconceito brasileiro contra seus parceiros sul-americanos é evidente e despreza o mercado com promoções e informações, mesmo sabendo que é dessa região que o Brasil recebe 70% de todo o receptivo internacional, de forma espontânea.
Função estruturante
Para mudar esse conceito, especialmente na reconstrução da política de marketing funcional para a amostragem ao mundo, falta-se cumprir a principal função estruturante atribuída ao Ministério do Turismo (MTur), como sustentabilidade ao setor, investimentos e incentivo ao desenvolvimento e o estabelecimento de ações voltadas às práticas inclusivas na atividade. Uma delas é o Mapeamento de Atrativos, Empreendimentos, Produtos e Serviços turísticos acessíveis. O material consiste em um documento técnico que tenha como objetivo apresentar um rol de informações sobre produtos e serviços turísticos disponíveis no mercado brasileiro. Esse Mapeamento é um trabalho realizado em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO. O material também tem o dever de focalizar conceitos sobre acessibilidade e mobilidade, abordando o que é turismo acessível, suas barreiras, critérios de caracterização de acessibilidade, orientações gerais e específicas, entre outros temas.
O produto turístico brasileiro caracteriza-se por oferecer tanto ao turista doméstico, como estrangeiro uma diversificada gama de opções, com destaque aos atrativos naturais, aventura e histórico-cultural. Ao Norte e Nordeste a Amazônia e as lindas praias do litoral atlântico mostram a diversidade de atrativos turísticos e as florestas vistas como “pulmão do mundo”. Há grande interesse pelas cidades históricas de Minas Gerais, as praias do Rio de Janeiro e os negócios em São Paulo dividem o interesse no Sudeste. O centro-oeste mostra sua pujança econômica na área dos agronegócios e, ao sul, o Paraná com a Foz do Iguaçu, os pampas e climas frios gaúchos, as praias de Santa Catarina são os pontos mais procurados.
Gargalos mais recorrentes
impeditivos ao receptivo internacional no Brasil:
1 – Desinformação e política de marketing e mercadológica erráticos com pouca informação e a procura de marcados de continentes distantes. Falta de conectividade digital, mesmo ante o domínio da Internet e a Inteligência Artificial na comercialização com a definição de novos produtos a partir de vocações naturais, históricas e culturais do país.
2 – Política de Estado – O Estado brasileiro se omite em assumir a consolidação de uma política de turismo como plataforma única e centralizada, elegendo o setor prioritário como fator econômico e social.Falta a execução de um Plano Nacional de Turismo. O último PNT elaborado pelo Ministério do Turismo foi o de 2018/2022, do qual uma vírgula sequer foi movida do papel.
3 – Incentivos e investimentos – Carência de projetos urbanos e falta de incentivos, investimentos e vontade política à atividade. Há que se investir na sustentabilidade na infraestrutura como estradas, segurança pública e equipamentos urbanos mais necessários. Isso além de incentivos fiscais e linhas de crédito para o setor privado para estimular investimentos em hotéis, restaurantes e serviços turísticos.
4 – Falta de parceria estrutural público-privada na busca da captação turística internacional. Cada setor puxando para lado oposto não se chega a lugar nenhum. Carece de um mais sério e profissional exercício de políticas estratégicas de informação sobre a imagem negativa do Brasil no Exterior.
5 – Malha aérea – Serviços de aviação deficitários em número e voos, má conservação de aeroportos, combustíveis e estacionamento muito caros. O setor é deficitário e carente, o que tem lavado inclusive a falência do setor aéreo nacional, sendo um dos raros países sul-americanos que não tem uma empresa própria de aviação.
6 –Portos sem infraestrutura – Faltam terminais turísticos confortáveis e adequados nos portos brasileiros. A atual estrutura é mais voltada ao transporte de cargas. Além de uma legislação portuária que data de 1914. Devido à má qualidade no receptivo portuário os cruzeiros marítimos internacionais evitam encorar na costa brasileira.
7 – Infraestrutura precária – Má conservação e manutenção de monumentos e logradouros turísticos. E carência de mobilidade, especialmente ao que se refere a transporte coletivo urbanoadequado ao turismo.Dificuldade em acessibilidade para deficientes como calçadas, rampas e sinalizações sonoras aos deficientes visuais.
8 – Má qualificação de serviços – Mão de obra de baixa qualidade dos agentes e prestadores de serviços turísticos, especialmente em bares e restaurantes. Isso acontece também com relação aos guias turísticos, monoglotas e sem conhecimentos mais profundo das atrações apresentadas aos visitantes.
9 – Violência urbana – A recorrente e incontrolável violência nas principais cidades turísticas. Carência de polícia especializada na segurança dos turistas.
10 – Consciência coletiva – Ausência de empatia comunitária à atividade turística, como fator social e econômico. Isso além da mentalidade comercial inadequada com alteração de preços nas altas temporadas, o que espanta os visitantes.
11 – Sinalização ineficiente – A sinalização indicadora de ruas e logradouros é monoglota. Faltam folhetos explicativos e orientadores sobre os locais procurados, quer histórico, natural, cultural ou urbano.
12 – Parques ecológicos largados – Dos 74 parques ecológicos classificados são deficientes em guias especializados, com trilhas mal traçadas, deficiência em áreas para camping e pousadas. Apenas 4 contam com estrutura apropriada.
13 – Foco mercadológico errático – Dar foco especial aos mercados vizinhos, ao contrário de buscar visitantes de outros continentes. Devido ao preconceito sul-americanohá um descaso profissional-informativo com o mercado da América do Sul, ignorando que são os países de nosso continente os que mais nos mandam visitantes.
14– Conta Satélite do Turismo – Pensada na primeira gestão do Ministério do Turismo, em 2003, a Conta Satélite do Turismo foi um projeto esquecido como instrumento estatístico idealizado para gerar informações sobre o desempenho do turismo na economia, com finalidade de mensurar tudo o que é produzido e consumido pela atividade turística.
15 – Revitalização do Ministério do Turismo. O MTur é o de orçamento mais minguado da Esplanada dos Ministérios. A pasta é geralmente negociada em trocas políticas, sem maiores compromissos com o setor especificamente.
José Osório Naves
o Jornalista
o Coordenador Geral da Câmara Temática de Marketing e Comercialização do Conselho Nacional do Turismo.
o Diretor de Comunicação da CNTur
Crédito da foto: Pixabay